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2009-12-26

Ano Internacional da Astronomia - Dia 347 "Astrolábio planisférico árabe do Século XVI/XVII-Falso Abd al – A’imma"

Astrolábio planisférico árabe do Século XVI/XVII
Falso Abd al – A’imma

Félix Rodrigues
Astrolábio é um vocábulo de origem árabe, formado por dois vocábulos. O primeiro, astron, significa astro ou estrela, e o segundo do verbo lambanein, que quer dizer “apanhar”. Assim astrolábio quer dizer “domar os astros” ou, em português arcaico, “pesar os astros”. Este instrumento astronómico é muito provavelmente de origem grega, mas não se sabe ao certo a data do seu aparecimento nem qual era a sua primeira forma ou modo de utilização.
Com importante utilização durante a Idade Média ao nível da astrologia e astronomia, cujas áreas se fundiam e confundiam, o astrolábio foi aperfeiçoado pelos árabes com o objectivo de ter uma representação do céu num determinado instante. Assim, os astrolábios dessa época tinham três finalidades: determinar a altura de um astro no céu, fornecer o aspecto do céu num determinado dia e até mesmo ser um calendário perpétuo.
Os astrolábios árabes eram constituídos normalmente por uma peça central, denominada mater, um círculo com bordo saliente e graduado, onde encaixavam diversas lâminas circulares, os tímpanos ou tábulas e recobertos por um disco circular, a aranha, rete ou aranea.
O exemplar existente no Museu de Angra do Heroísmo, atribuído a Abd al – A’imma, possui cinco lâminas circulares, com inscrições no alfabeto árabe, tanto na frente como no verso, o que corresponde a dez possíveis discos ou aspectos distintos do céu em vários locais (latitudes) do mundo árabe. Para além destes discos existe no eixo central, a clavus que, atravessando o centro, serve de base ao denominado cavalo. O cavalo contém duas zonas: uma designada de face facies, e outra que se lhe opõe, o dorso ou dorsum, que para além de possuir uma margem graduada utilizada para determinar a altura de qualquer astro em relação ao horizonte, contém também o que parece ser um calendário perpétuo.
Abd al – A’imma é provavelmente um dos mais conhecidos e profícuos decoradores persas de astrolábios, membro da escola de astrolabistas de Isfaão, no Irão (1678-1722) (Gingerich et al., 1972). Alguns investigadores classificam os astrolábios de Abd al-A’imma em duas categorias: uma correspondente aos astrolábios muito precisos do ponto de vista astronómico (a grande maioria) e outra, a que chamam de “degenerados” que contêm muitas imprecisões e que crêem serem imitações dos primeiros com fins meramente decorativos. Poderia pensar-se que esse tipo de astrolábios serviam os propósitos da astrologia, mas tal não é verdade, pois nessa época a astrologia era tão precisa quanto a astronomia. A maioria dos astrolábios no grupo dos “degenerados” tem uma data inscrita no verso abaixo do nome de Abd al – A’imma.
Na figura seguinte, o astrolábio da direita é astronomicamente correcto (apresenta uma grelha de 60x60 divisões no quadrante superior esquerdo), em contraste com o da direita que é “degenerado” (apresenta uma grelha de 47x39 divisões).

Os astrolábios de Abd al – A’imma astronomicamente correctos, tem aranhas ricamente decoradas (ver imagem seguinte) em oposição aos que tinham propósitos decorativos, onde essas decorações eram mais simples.


É comum encontrar no verso dos astrolábios de Abd al –A’imma, à semelhança dos astrolábios da escola de Isfaão, dois arcos no quadrante superior direito, um para determinação da altitude do Sol ao meio-dia e outro para quando o sol se encontra no azimute de qibla (direcção de Meca). O mesmo não poderá ser dito relativamente aos “degenerados”. Na figura seguinte são bem visíveis, no quadrante superior direito, os dois conjuntos de arcos, sete para a esquerda e três para a direita, que se interceptam sensivelmente a 1/3 do raio do astrolábio.

Nos astrolábios atribuídos a Abd al –A’imma, para que estejam astronomicamente correctos, a aranha não pode apresentar simetria, pois esta é uma carta estelar onde folhas de plantas apontam para a posição das estrelas mais brilhantes no céu.
Os discos que se encaixam na base do astrolábio, contendo “circunferências” ou arcos de circunferência, correspondem a projecções estereográficas polares da esfera celeste sobre um pano, que nos astrolábios astronomicamente correctos correspondem a raios apresentam uma razão de 1:2,33. Essa razão é verificada tanto nos discos como nas projecções estereográficas polares da esfera celeste existentes na aranha (ver imagem seguinte).Cada disco ou lâmina, ao assentar na madre, tinha, na face voltada para cima a projecção estereográfica polar de determinada latitude terrestre. Chamam-se almucântaras aos círculos paralelos ao horizonte. Na figura seguinte apresenta-se um diagrama de um astrolábio árabe, onde são visíveis as linhas do horizonte, do equador, dos trópicos de Câncer e de Capricórnio, bem como o zénite, entre outras funcionalidades e informações contidas tanto na rete como em cada placa.

Na figura seguinte apresenta-se, em esquema a forma como o astrolábio árabe deveria ser montado, indicando-se também o nome das peças que o constituem.


Os astrolábios árabes também incorporavam um calendário perpétuo, com instruções precisas para a contagem do tempo e identificação dos dias da semana, numa lógica semelhante à do “Calendario perpetuo allegorico, dedicado a Sua Magestade Senhor Dom Pedro Primeiro, Imperador Constitucional & defensor perpetuo do Brasil, ca. 1826”. As instruções associadas a esse calendário não eram universais, mas válidas para o calendário islâmico, por um período de 60 anos.
Na figura seguinte apresenta-se um desses calendários perpétuos contidos nos astrolábios árabes.


Nos astrolábios de Abd al –A’imma astronomicamente correctos, esses elementos estão presentes. Nos astrolábios “degenerados”, faltam alguns desses elementos, e por exemplo, a estrela Vega (em árabe, significa ave de rapina) é representada pela cabeça de uma ave, uma representação que não se encontra nos astrolábios astronomicamente correctos. Nos astrolábios correctos, a estrela Vega é representada por um ponto semelhante ao olho de um pássaro.
As constelações actuais tem nomes de personagens da mitologia grega, mas as estrelas, na sua maioria, receberam nomes árabes. Na constelação de Orionte, o caçador, a estrela baptizada de Betelgeuse, significa em árabe “ombro do gigante”. Na constelação da Virgem, que é usualmente representada por uma donzela com cereais no colo (indicava aos antigos, o período da colheita, que nessa altura era um trabalho essencialmente feminino), a estrela mais brilhante chama-se Spica, “espiga” em árabe. A estrela Sirius, que faz parte da constelação de Cão Maior (Canis Major), tem um nome que significa “ardente”, por ser a estrela mais brilhante que podemos observar no céu, a olho nu.
O nome «Altair», a alfa da Águia, provém do nome dado pelos Árabes ao conjunto formado por Alfa, Beta e Gama: «Al Nasr al Tair», a Águia Voadora. Altair é a décima segunda estrela com maior brilho aparente de todo o céu.
O nome da estrela mais brilhante do Cisne, Deneb, provém de “Al Dhanab al Dajajah”, a “Cauda da Galinha”, pois para os árabes era esse o animal representado pela constelação. Há várias estrelas com o nome «Deneb», pois a palavra significa «cauda» em árabe. No entanto, quando usado isoladamente refere-se à Alfa do Cisne enquanto que no caso de outras estrelas lhe é acrescentado o nome da respectiva constelação, como é o caso de Deneb Kaitos (Beta da Baleia), de Deneb Delfim (Épsilon do Delfim) ou Deneb Okab (Delta da Águia). Há também estrelas cujo nome deriva de Deneb, como é o caso de Denebola, a Beta do Leão.
Para os árabes, a Úrsula Maior era representada por uma caravana no horizonte, o Triângulo de Verão por uma águia em voo, e a estrela Antares (estrela nitidamente vermelha) na constelação de Escorpião, pelo coração de um escorpião.
Lupus, o Lobo, é uma antiga "constelação". O nome pode ser devido a um erro de tradução do árabe Al Fahd, que quer dizer Leopardo ou Pantera. A constelação tem sofrido algumas alterações ao longo do tempo. Inicialmente poderia ter representado o porco de Erymancia, que foi caçado por "Hércules" e Centauros.
Lepus (Lep), a Lebre, é uma constelação do hemisfério celestial sul logo ao sul do equador celeste, abaixo da constelação de Orionte, e possivelmente representando uma lebre sendo caçada por Orionte, o caçador. Lepus é uma das 48 constelações de Ptolomeu, e figura também entre as 88 constelações modernas. Dada a posição celestial dessa constelação, os árabes conheciam-na e certamente que lhe atribuíam o mesmo nome que Ptolomeu.
No Astrolábio planisférico árabe do Século XVI/XVII (Falso Abd al – A’imma) do Museu de Angra do Heroísmo, é possível observar na rete, os símbolos da lebre, da águia e da galinha, alusivos a constelações quer do hemisfério celestial Norte quer do hemisfério celestial sul.
Na imagem seguinte, apresentam-se as principais representações árabes das constelações celestiais.
As representações celestes mais comuns nos discos dos astrolábios árabes eram Meca, latitude 22º e Medina na latitude 25º. No entanto, nos astrolábios árabes mais antigos (século XIII) era possível encontrarem-se projecções estereográficas polares da esfera celeste do Cairo (30º), Bagdad (33º), Marrakech (31º), Jerusalém (32º), Ceuta (36º) e Sevilha (37º30’). No século XV algumas lâminas projectavam o céu de Fez (34º30’), Tetuan (35º30’), Málaga (36º40’) e Córdova (38º30’). No século XVII era possível encontrar discos referentes a Saragoça, Alexandria, Basra, Damasco, Tunes, Tarsos, Sardenha, Azerbeijão, Valência, Toledo e Roma.
Na figura seguinte, apresenta-se um astrolábio árabe, que mantendo muitas das características anteriormente referidas, tinha apenas interesse decorativo, falhando, por muitas imprecisões na representação correcta dos astros no céu, daí a ser chamado falso ou “degenerado”.

Uma das primeiras razões a apontar para que se trate de um astrolábio árabe degenerado, é a simetria dos elementos da rete, que nos astronomicamente correctos, tal como se referiu anteriormente, não deve existir. Por outro lado, no total de peças aqui apresentados falta-lhe a alidade, que se representa na figura seguinte e que servia para observar a altura dos astros, bem como o cavalo.

2 Comments:

At 20:58, Blogger Cleitonsilva said...

interessantissimo este assunto, mas preciso de algum livro que comente sobre o instrumento. Se tiver alguma bibiografia me mande !!

Att.,


Cleiton cleitonrsilva@gmail.com

 
At 04:14, Blogger Wilson said...

Na verdade o Star finder, um localizador de estrelas usado em navegação astronômica é um astrolábio construidos com material moderno.
E isso quer dizer que, se os astrolábios fossem construídos nos dias de hoje seriam bem mais simples porque poderiam evitar a transferência dos discos.

Estou iniciando uma industrialização de astrolábios para fins de navegação e orientação .

 

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